Alguns romances, apesar de alcançarem grande sucesso, acabam por cair ainda assim numa disputada discussão a respeito de sua qualidade ou construção. O livro O Fortim, escrito em 1981 por F. Paul Wilson, é um destes casos onde alguns apontam que o autor deveria ter tomado outro rumo ou então o ovacionam por todo o seu conteúdo. Fato é que em seu tempo tornou-se bestseller, gerando a série denominada Ciclo do Inimigo, cuja ideia inicialmente não havia sido planejada.
No ano de 1941, um grupo de soldados nazistas comandados pelo capitão Woermann chegam a um pequeno e antigo vilarejo que fica as bases de montanhas localizadas numa região denominada Passo Dinu, Romênia. A localização era de vital importância aos nazistas visto que ali seria uma das principais formas de ataque inimigo, caso acontecesse algum, a uma localidade mais ao sul, onde seria instalado um novo campo de concentração. Ao final do vilarejo, uma espécie de forte, um fortim, foi construído de forma mais rente as montanhas, a beira de um precipício. As paredes internas são forradas de cruzes feitas de bronze, o calor parece não fazer efeito do lado de dentro e ninguém sabe ao certo quem é o dono e qual o propósito de sua construção.
Quando um dos soldados, acreditando que as cruzes são sinais de que ali encontra-se um tesouro papal, percebe que no porão há de fato uma cruz diferente das demais e, por trás dela, uma passagem secreta na parede, ele acaba libertando um ser maligno que se movimenta pelas sombras e assassina com facilidade. Um soldado nazista é morto a cada noite. Com esse movimento, duas outras pessoas desconexas são convergidas ao Passo Dinu: um homem ruivo e misterioso do outro lado da Europa, que desperta e sente que deve rumar ao fortim, e uma jovem judia e seu pai, um professor estudioso do local, que acabam por serem trazidos a força pelo regime ditatorial local.
F. Paul Wilson constrói uma boa narrativa onde as histórias dos personagens vão sendo apresentadas gradativamente, podendo mostrarem-se verdadeiras ou falsas, amplificando a sensação de desconfiança ao redor da ação. A atmosfera é também outro ponto alto, desenvolvendo-se a cada nova morte um terror absoluto da noite, visto que é o único momento em que o inimigo ataca. O desfecho é outro momento interessante do livro, quando, sem entregar muito do enredo, a narrativa adquire tons épicos bem próximos da literatura de Robert E. Howard, criador de Conan, sendo este assumidamente uma das inspirações de Wilson.
Além da série do Ciclo do Inimigo, o livro rendeu duas adaptações para outras mídias. A primeira, um filme de 1983 dirigido por Michael Mann, ganhou críticas negativas quanto a forma e modo pelo qual a história foi reproduzida. A segunda trata-se de uma minissérie em quadrinhos em cinco edições lançada pela editora americana IDW, em 2006, desenhada por Matthew Dow Smith, que já participou de projetos como Sandman: Teatro do Mistério, Hellboy e Doctor Who.
O filme tem como pontos negativos o fato de eliminar situações importantes a história, modificar a estrutura do próprio fortim, além de alterar a personalidade dos personagens e adicionar personagens desnecessários, como o padre da vila. Os personagens Woermann e Kaempffer, dois nazistas de alto posto, representavam a situação good cop, bad coop, o que dava equilíbrio a narrativa. Michael Mann parece ter decidido desconstruir essa ideia e colocou ambos com a personalidade padrão nazista do imaginário popular, ambos rudes, violentos e sem modos. Além disso, o ator Ian McKellen, recentemente imortalizado pela também atuação em Senhor dos Anéis como Gandalf, representa um papel que chega a dar pena. Não pelo papel, que no livro é importante, mas na maneira como ele é deixado de lado no filme. Por fim, o filme está mais como uma viagem alucinógena, visto que ele é apresentado de maneira bastante experimental, e desagradou a todos os fãs que esperavam por algo mais fiel. Uma das ressalvas que o diretor assumiu quanto ao filme foi o fato de que seu corte original aparentemente foi reduzido sem seu aviso prévio e lançado desta maneira nos cinemas, o que teria causado a sensação de confusão e história contada as pressas.
Em contrapartida, a HQ de Matthew Dow Smith conjuga melhor a narrativa com seus traços e cores simples, porém expressivos, combinando com o teor misterioso que paira pela história. Ele procurou manter-se mais próximo ao livro, sendo esta uma melhor opção aos fãs. Infelizmente, as edições ainda não foram lançadas no Brasil, mas são de fácil compra via internet.
A série Ciclo do Inimigo, originalmente, não era para ser uma série em si. O segundo livro, O Sepulcro, conta uma história com outros personagens e situações tal como acontece com o terceiro livro, O Toque Mágico. Contudo, F. Paul Wilson resolveu uni-los a partir do quarto livro, Renascido, criando um vínculo antes inexistente entre os outros livros e fundando assim o Ciclo. No Brasil, a série foi publicada até o quinto livro, Represália, nas décadas de oitenta e noventa, nunca chegando até o último livro. A Editora Record republicou o primeiro e segundo livro em formato pocket, infelizmente sem qualquer aviso se dará continuidade a publicação ou não. As edições antigas, da primeira a quinta, podem ser encontrados facilmente em sebos a preços razoáveis.
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