Sem categoria junho 1, 2015

Retrospectiva Mad Max

Retrospectiva Mad Max, Parte 1

Bem-vindo de volta, caro leitor! Aproveitando o sucesso de Mad Max: Estrada da Fúria nos cinemas, decidi fazer uma espécie de retrospectiva da tetralogia, realçando alguns temas específicos, antes de falar sobre o Estrada da Fúria em si.

O primeiro filme da série chama-se, apropriadamente, Mad Max. Estrelando Mel Gibson como o protagonista, Max Rockatansky, ele foi lançado em 1979 na Austrália. O filme mostra a sociedade moderna entrando em colapso devido à falta de combustível, com o sertão australiano (outback), especificamente, virando uma terra sem lei, com gangues criminosas aterrorizando a região quase impunemente. A única autoridade que ainda existe é a Força-Patrulha Central (policiais motorizados, basicamente), mas ela é quase ineficaz; em certo momento, eles capturam Johnny the Boy, um dos membros da gangue de Toecutter (os antagonistas do filme, uma gangue criminosa de motoqueiros), mas ninguém se apresenta para testemunhar contra ele de tanto medo de sofrerem represálias. O chefe de polícia, Fifi Macaffee, entra em desespero e diz que os policiais podem fazer de tudo para deter os criminosos, desde que isso não apareça nos registros.

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Max Rockatansky; Toecutter (interpretado por Hugh Keays-Byrne, que também interpreta Immortan Joe em Estrada da Fúria!); e Bubba Zanetti, o principal capanga de Toecutter e o que chega mais perto de matar Max. Se Toecutter é a força bruta, Zanetti é o cérebro.

E a coisa não para por aí: a gangue de Toecutter ateia fogo a Jim “Goose”, amigo e parceiro de Max, e quase o mata. Horrorizado, Max visita Fifi para dizer que está se demitindo. Fifi tenta convencê-lo a ficar, mas Max não está fazendo isso só por causa do que aconteceu com Goose:

“Estou com medo, Fif. Sabe por quê? É aquele circo de ratos lá fora. Estou começando a gostar dele. Olha, mais um pouco naquela estrada e eu vou ser um deles, sabe? Um louco terminal, só que com um distintivo de bronze pra dizer que sou um dos mocinhos.”

Fifi o convence a sair de férias com a família antes de tomar uma decisão final. Mas, como desgraça pouca é bobagem, eles esbarram justamente com a gangue de Toecutter, que mata o filho de Max e brutaliza a esposa dele até ela ficar em estado crítico. Max então pega um carro especial que havia sido montado para ele (“o último dos V8 Interceptors”, como descrito no segundo filme) e parte em uma cruzada contra a gangue de Toecutter, matando todos, deixando Johnny the Boy por último: Max o prende com uma corrente a um carro com o tanque vazando e lhe dá uma escolha, tentar cortar a corrente (ou a própria perna) para escapar ou queimar que nem aconteceu com Goose.

Mad Max foi um dos filmes mais lucrativos da história, graças ao orçamento baixo (mas calma que não é tosco!) e ao tremendo sucesso na Austrália. Diferente de tantos filmes americanos da década de 80 (como Stallone Cobra, por exemplo), ele não glorifica a vingança, a violência, o clichê do “protagonista que ignora as regras para fazer o que é certo” ou a ideia (horripilante) de que a polícia tem que ignorar as regras: pelo contrário, ele traça um forte paralelo entre a decadência (econômica e cívica) da sociedade com a decadência moral de Max. É verdade que a gangue de Toecutter só tem assassinos e estupradores, pessoas horríveis de quem não tem que se ter pena quando são mortos por Max; mas ele não os mata para fazer justiça, mas apenas por ódio, e ao final do filme continua um homem completamente vazio. O filme, na verdade, não é apenas um alerta contra a dependência excessiva do petróleo; ele mostra bem que a forma de “justiça” de Mad Max só pode existir em um mundo igualmente louco, quando tudo está entrando em ruínas.20150415-mad-max-2-1981

O segundo filme é Mad Max 2 (que saiu nos Estados Unidos como The Road Warrior, já que o primeiro filme não era conhecido do público americano; aqui no Brasil saiu como Mad Max 2: A caçada continua). Lançado em 1981, foi o primeiro da série a fazer sucesso internacional e também foi o grande responsável por Mel Gibson virar um astro de Hollywood. Ele já se passa no cenário pós-apocalíptico popularizado pela série; aparentemente, alguma catástrofe nuclear terminou de destruir o que sobrava da civilização. Como diz a narração de abertura:

“Para entender quem ele era, é preciso voltar no tempo para quando o mundo era movido pelo combustível negro e grandes cidades de aço e canos brotavam do deserto. Tudo se foi… Varrido do mapa. Por razões esquecidas há muito tempo, duas grandes tribos guerreiras entraram em guerra e causaram um incêndio que os tragou a todos. […] E nesse vendaval de podridão, as pessoas comuns eram fustigadas e esmagas. Pessoas como Max, o guerreiro. Em um rugido de motor, ele perdeu tudo e tornou-se uma casca vazia, um homem esgotado de corpo e alma, atormentado pelos demônios do passado, vagando pela desolação. E foi aqui, nestas ruínas, que ele reaprendeu a viver.”

É neste cenário que Max se envolve no conflito entre a gangue (talvez bando bárbaro seja uma descrição mais adequada) dos “cães de guerra” de Lorde Humungus e uma comunidade que conseguiu botar uma refinaria em funcionamento. Humungus quer a refinaria para si, e todos que tentam escapar da “cidade” sitiada são perseguidos e mortos. Max faz um trato com Papagallo, o líder da comunidade: ele lhes trará um caminhão que encontrara abandonado no deserto para que escapem levando consigo todo o combustível; em troca, ele quer gasolina o bastante para encher o tanque de seu carro e ir embora. Ele consegue recuperar o caminhão e se prepara para partir, mas Papagallo tenta convencê-lo a ficar, talvez construir um futuro com eles. Max recusa categoricamente, e Papagallo lhe passa uma descompostura:

“O que é que há com você, hein? Está procurando o quê? Qual é, Max, todo mundo procura por alguma coisa. Você é feliz lá fora, andando sem rumo? Vivendo de um dia para o outro? Você é um animal carniceiro, Max, um verme. Sabia disso? Você se alimenta do cadáver do velho mundo. Me conta a sua história, Max. Vai, me conta a sua história. O que te esgotou, hein? Matou gente demais? Viu gente demais morrer? Perdeu família? Ah, então é isso, você perdeu sua família? E acha que isso faz de você alguém especial? Você acha que é o único que já sofreu? Todos aqui passamos por isso, mas nós não desistimos. Ainda somos seres humanos. Mas você? Você está lá fora com o lixo. Você não é nada.”

Max ignora o discurso e vai embora, mas é atacado pelos capangas de Humungus. Seu cachorro de estimação é morto e os bandidos ativam a armadilha do seu carro, o V8 Interceptor, fazendo com que ele exploda. Max, quase morto, é resgatado pelo Gyro Captain (em uma tradução livre, seria “capitão do girocóptero”) e levado de volta para a “cidade”, onde Papagallo se prepara para dirigir o caminhão com o combustível (sabendo que será o alvo principal de Humungus e seus homens). Max se oferece para dirigir no lugar dele, Papagallo responde que é muito tarde para acordos, e Max responde que não quer fazer um acordo.

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Max Rockatansky fazendo cosplay de Rob Halford e Cachorro, seu cachorro de estimação; Lorde Humungus fazendo cosplay de Conan bondagista; e o Gyro Captain (interpretado por Bruce Spence, que depois interpretaria Jedediah no terceiro filme – também um piloto de girocóptero!) e sua cobra de estimação (“A cobra é minha, sou eu quem vai cozinhá-la!”).

A parte final do filme é uma intensa perseguição de carros (uma das melhores perseguições do cinema mesmo hoje em dia!); muitos morrem defendendo o caminhão, inclusive Papagallo, até que finalmente Humungus e seu principal capanga são mortos, fazendo com que os selvagens que sobraram desistam da perseguição. Max descobre que o caminhão na verdade estava cheio de areia – o combustível estava escondido nos outros veículos – e o Gyro Captain lidera os sobreviventes para a costa, onde eles se tornam a Grande Tribo do Norte. Max se deixa ficar para trás, e eles nunca mais o viram.

Mad Max mostra um bom homem entrando em ruínas moral e espiritualmente, espelhando o que acontece com a sociedade à sua volta; paradoxalmente, Mad Max 2 mostra esse mesmo homem redescobrindo sua humanidade quando o mundo já está arruinado. E não só ele: enquanto os “civis inocentes” do primeiro filme se submeteram ao medo da gangue de Toecutter, a comunidade de Papagallo tenta lutar contra o domínio de Humungus. Não todos – alguns tentam fugir e são mortos –, mas o bastante para ajudarem Max a parar de se preocupar só com o próprio sofrimento e prestar atenção no mundo ao seu redor.

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Até os vilões dos dois filmes trabalham esses temas: Toecutter é um completo lunático que domina sua gangue pela força e intimidação, alguém que se aproveita da decadência ao seu redor (ou talvez tenha se deixado levar por ela); já Humungus é alguém que, como Max, Papagallo e tantos outros, sofreu perdas (é só prestar atenção em algumas das falas dele: por exemplo, “Quieto, meu cão de guerra. Entendo sua dor; todos perdemos alguém que amamos.”), mas escolheu abandonar sua humanidade em vez de lutar por ela.

Outra coisa interessante desses primeiros filmes da tetralogia é que Max não é um herói de ação como os que viriam depois: James Braddock (Braddock – o super comando), John Matrix (Comando para matar) e John Rambo (Rambo 2: A missão), pessoas quase sobre-humanas, capazes de massacrar dezenas de capangas praticamente sem suar. Ele está em ótima forma, tem reflexos muito rápidos e, acima de tudo, é um excelente motorista, mas não é um supercombatente nem nada do tipo. Ah, e ele sangra e se machuca, também; logo no começo de Mad Max 2 o vemos mancando da mesma perna que foi ferida no primeiro filme. Nesse ponto, dá para compará-lo com o John McClane do primeiro Duro de Matar (e só o primeiro! As continuações ficam cada vez mais exageradas), que também sofre para resolver as coisas e não é nenhum super-humano.

Bom, a conversa está ótima, mas por enquanto já chega! Nos vemos na parte 2 no mesmo nerd-horário, mesmo nerd-canal e mesmo nerd-programa!

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